Os Medicamentos Do Espírito
1º O Que São E Para Que Servem Os Psicotrópicos? - A partir de 1950, as substâncias químicas - ou psicotrópicos - modificaram a paisagem da loucura. Esvaziaram os manicômios e substituíram a camisa de força e os tratamentos de choque pela redoma medicamentosa. Embora não curem nenhuma doença mental ou nervosa, elas revolucionaram as representações do Psiquismo, fabricando um "novo homem", polido e sem humor, esgotado pela evitação de suas paixões, envergonhado por não ser conforme ao ideal que lhe é proposto.
Receitados tantos por clínicos gerais quanto pelos especialistas em Psicopatologia, os Psicotrópicos tem o efeito de normalizar comportamentos e eliminar os sintomas mais dolorosos do sofrimento psíquico, sem lhes buscar a significação.
2º Psicotrópicos E Seus Grupos - Os Psicotrópicos são classificados em três grupos:
- Os Psicolépticos - neste grupo encontram-se os medicamentos hipnóticos, que tratam os distúrbios do sono, bem como os ansiolíticos e os tranquilizantes, que eliminam os sinais de angústia, ansiedade, fobia e de diversas outras neuroses e, por fim, os neurolépticos (ou antipsicóticos), que são medicamentos específicos para a Psicose e todas as formas de Delírios crônicos ou agudos.
- Os Psicoanalépticos - neste grupo reúnem-se os estimulantes e os antidepressivos.
- Os Psicodislépticos - neste grupo estão os medicamentos alucinógenos, os estupefacientes e os reguladores de humor.
3º A Camisa De Força Química - A princípio, a Psicofarmacologia deu ao homem uma recuperação da liberdade. Postos em circulação por dois psiquiatras franceses, Jean Delay e Pierre Deniker, os neurolépticos desenvolveram a fala ao louco. Permitiram sua reintegração na cidade. Graças a eles, os tratamentos bárbaros e ineficazes foram abandonados. Quantos aos ansiolíticos e aos antidepressivos, trouxeram aos neuróticos e aos deprimidos uma tranquilidade maior.
No entanto, à força de acreditar no poder de suas poções, a Psicofarmacologia acabou perdendo parte de seu prestígio, a despeito de sua impressionante eficácia. Na verdade, ela encerrou o sujeito numa nova alienação ao pretender curá-lo da própria essência da condição humana. Por isso, através de suas ilusões, alimentou um novo irracionalismo. É que, quanto mais se promete o "fim" do sofrimento psíquico através da ingestão de pílulas, que nunca fazem mais do que suspender sintomas ou transformar uma personalidade, mais o sujeito, decepcionado, volta-se em seguida para tratamentos corporais ou mágicos.
Não surpreende, portanto, que os excessos da Farmacologia tenham sido denunciados justamente por aqueles que a haviam enaltecido, e que hoje reivindicam que os remédios da mente sejam administrados de maneira mais racional e em coordenação com outras formas de tratamento: Psicoterapia e Psicanálise.
... o inventor desses medicamentos, Henri Laborir, sempre declarou que a Psicofarmacologia não era, como tal, a solução para todos os problemas:
"Por que ficamos contentes por dispor de Psicotrópicos? Porque a sociedade em que vivemos é insuportável. As pessoas não conseguem mais dormir, ficam angustiadas e necessitam ser tranquilizadas, mais nas megalópoles do que noutros lugares. Às vezes me censuram por haver inventado a Camisa De Força Química..."
... De fato, ela (a Psicofarmacologia) permite que todos os médicos - em especial os clínicos gerais - abordem da mesma maneira todo tipo de afecções, sem que jamais se saiba de que tratamento elas dependem. Assim, Psicoses, Neuroses, Fobias. Melancolias e Depressões são tratadas pela Psicofarmacologia como um punhado de estados ansiosos, decorrentes de lutos, crises de pânico passageiras, ou de um nervosismo extremo, devido a um ambiente fácil.
... passada a Ideologia Medicamentosa ...
4º A Banalização Da Psicanálise E O Destino Da Anna O. - A palavra "Psicanálise" fez sua aparição em 1896, num texto de Sigmund Freud redigido em francês. Um ano antes, com seu amigo Josef Breuer, ele havia publicado seus famosos Estudos Sobre A Histeria, livro em que relatava o caso de uma moça judia vienense que sofria de uma estranha doença de origem psíquica, na qual eram postas em cena Fantasias Sexuais através de contorções do corpo. A paciente chamava-se Berta Pappenheim, e seu médico, Breuer, que vinha cuidando dela pelo chamado método "catártico", deu-lhe o nome de Anna O. A história dessa paciente viria a se tornar lendária, pois é Anna O., isto é, a uma mulher, e não a um cientista, que se atribui a invenção do método Psicanalítico: um tratamento baseado na fala, um tratamento em que o fato de se verbalizar o sofrimento, de encontrar palavras para expressá-lo, permite, se não curá-lo, ao menos tomar consciência de sua origem e, portanto, assumi-lo.
Consultando os arquivos, os historiadores modernos demonstraram que o famoso caso de Anna O., apresentado por Freud e Breuer como protótipo da cura catártica, não levou, na realidade, à cura da paciente. Em todo caso, Freud e Breuer decidiram publicar a história dessa mulher e expô-la como um caso princeps, para melhor reivindicar, em oposição ao psicólogo francês Pierre Janet, a prioridade da descoberta do método catártico. Quanto a Berta Pappenheim, se não foi curada de seus sintomas, certamente se transformou numa outra mulher. Militante feminista, devota e rígida, consagrou sua vida aos órfãos e às vítimas do anti-semitismo, sem jamais evocar o tratamento psíquico que recebeu na juventude e que fez dela um mito.
5° Psicanálise Presente E Não Presente - Quanto mais as instituições psicanalíticas implodem, mais a Psicanálise está presente nas diferentes esferas da sociedade e mais serve de referência histórica para a Psicologia Clínica que, no entanto, veio substituí-la. A língua da Psicanálise transformou-se num idioma comum, falado tanto pelas massas quanto pelas elites... Hoje em dia, ninguém mais desconhece o vocabulário Freudiano: fantasia, supereu, desejo, libido, sexualidade, etc...
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