segunda-feira, 20 de junho de 2016

Sobre Os Sonhos

                                                                Sobre Os Sonhos

                                                                  Uber den Trau

                                                                     Capítulo 4



      01° O Sonho E Sua Condensação - Estaremos inclinados a supor que algum tipo de Transformação tenha ocorrido mesmo nos Sonhos Confusos, embora não saibamos dizer se, também no caso deles, o que se transformou foi um (enunciado) optativo.

      Mas outra conquista do trabalho do Sonho, a qual tende a produzir Sonhos Incoerentes é ainda mais notável. Se, numa situação qualquer, compararmos o número de elementos de representação ou o espaço tornado para anotá-los, no caso do Sonho e no caso dos pensamentos oníricos a que a análise nos conduz, e dos quais se encontram vestígios no próprio Sonho, não nos restará nenhuma dúvida de que o trabalho do Sonho efetuou uma obra de Compreensão ou Condensação em larga escala. É impossível, a princípio, formar qualquer juízo sobre o grau dessa Condensação; no entanto, quanto mais fundo mergulhamos na análise do Sonho, mais impressionante ele se figura. De cada elemento do conteúdo do Sonho ramificam-se fios associativos em duas ou mais direções; cada situação do Sonho parece compor-se de duas ou mais direções; cada situação do Sonho parece compor-se de duas ou mais impressões ou experiências.

     


      2° A Interpretação Dos Sonhos - O próprio material dos pensamentos oníricos reunido para formar a situação do Sonho deve adaptar-se, é claro, para esse fim. Deve haver um ou mais elementos comuns em todos os os componentes. O trabalho do Sonho procede então como fazia Francis Galton ao produzir suas fotografias de família. Superpõe os diversos componentes, por assim dizer, fazendo-os coincidir um com o outro. O elemento comum a eles destaca-se então claramente da imagem conjunta, enquanto os detalhes contraditórios quase que se anulam mutuamente. Esse método de produção também explica, até certo ponto, os diversos graus da indefinição característica exibida por tantos elementos do conteúdo do Sonho. ... A interpretação do Sonho estabeleceu a seguinte regra: ao analisarmos um Sonho, um caso, uma incerteza se decomponham num "ou...ou", devemos substituí-las, para fins de interpretação, por um "e", e tomar cada uma das aparentes alternativas como um ponto de partida independente para uma série de associações.


      3° Sonho E Seu Processo De Criação - Quando um desses elementos comuns não se faz presente entre os elementos oníricos, o trabalho do Sonho trata de criá-lo, de maneira que seja possível dar aos pensamentos uma representação comum no Sonho. A maneira mais convincente de reunir dois pensamentos oníricos que a princípio não tem em comum é alterar a forma verbal de um deles, e assim aproximá-lo do outro, que pode estar similarmente revestido de uma nova forma de expressão linguística. Há um processo paralelo a esse na elaboração de rimas, onde o som semelhante tem de ser buscado da mesma maneira que o elemento comum em nosso caso. Grande parte do trabalho do Sonho consiste na criação desse tipo de pensamentos intermediários, que são amiúde altamente engenhosos, embora frequentemente pareçam forçados; estes criam então um vínculo entre a imagem composta no conteúdo manifesto do Sonho e os pensamentos oníricos, que são diversos em sua forma e essência e foram determinados pelos fatores motivadores do Sonho.

      ... Há muitas maneiras variadas de compor figuras desse tipo. Posso construir um personagem dando-lhe as feições de duas pessoas, ou posso dar-lhe a forma de uma pessoa mas pensar nela, no Sonho, como tendo o nome de  outra; posso ainda ter a imagem visual de uma pessoa, mas colocá-la numa situação apropriada a outra. Em todos esses casos, a combinação de diferentes pessoas num único representante no conteúdo do Sonho tem um sentido: destina-se a indicar um "e" ou um "assim como", ou a comparar entre si as pessoas originais em algum aspecto particular, que pode até ser específico no próprio Sonho. Em regra geral, contudo, esse elemento comum entre as pessoas fusionadas só pode ser descoberto pela análise e só é indicado no conteúdo do Sonho pela formação de figura coletiva. 



      4° A Condensação - Boa parte do que aprendemos sobre a Condensação nos Sonhos pode ser resumida nesta fórmula: cada elemento do conteúdo do Sonho é "sobredeterminado" pelo material dos pensamentos oníricos; não decorre de um único elemento dos pensamentos oníricos, podendo sua origem remontar a toda uma série deles. Esses elementos não precisam necessariamente ter uma estreita relação mútua nos próprios pensamentos oníricos; podem pertencer às mais, distantes e diversas regiões a trama desses pensamentos. O elemento onírico é, no sentido mais estrito da palavra, o "representante" de todo esse material diverso no conteúdo do Sonho. Mas a análise revela ainda um outro lado da complexa relação entre o conteúdo do Sonho e os pensamentos oníricos. Assim como as ligações levam de cada elemento do Sonho a diversos pensamentos oníricos, também cada pensamento onírico isolado, em geral, é representado por mais de um elemento do Sonho; os fios da associação não convergem simplesmente dos pensamentos oníricos para o conteúdo do Sonho, mas se cruzam e entrelaçam muitas vezes no discurso de sua jornada. 

      A Condensação, juntamente com a transformação dos pensamentos em situações ("dramatizações") é a característica mais importante e peculiar do trabalho do Sonho. Até agora, porém, nada transpirou sobre algum motivo que pudesse exigir essa compreensão do material.



terça-feira, 31 de maio de 2016

Sobre Os Sonhos

                                                              Sobre Os Sonhos

                                                             Uber den Traum


                                                                   Capítulo 3



      1° A Transformação Dos Pensamentos Oníricos - A transformação dos pensamentos oníricos latentes no conteúdo manifesto do Sonho merece toda a nossa atenção, visto ser esse o primeiro exemplo que nos é conhecido de Transposição Do Material Psíquico de um modo de expressão para outro, de um modo de expressão que nos é imediatamente inteligível para outro que só podemos chegar a entender com a ajuda de orientação e esforço, embora também ele deva ser reconhecido como uma função de nossa atividade anímica.





      2° Primeira Categoria Dos Sonhos - No tocante à relação entre o conteúdo latente e o manifesto, os Sonhos podem ser divididos em três categorias. Em primeiro lugar, podemos distinguir os Sonhos que fazem sentido e são, ao mesmo tempo, inteligíveis, ou seja, que podem ser inseridos sem maior dificuldade no contexto de nossa vida anímica. Temos inúmeros desses Sonhos. Em sua maior parte, eles são curtos e em geral nos parecem merecer pouca atenção, já que nada há de espantoso ou estranho neles. Aliás, sua ocorrência constitui um poderoso argumento contra a teoria segundo a qual os Sonhos se originam da atividade isolada de grupos separados de células cerebrais. Eles não dão nenhuma indicação de atividade psíquica reduzida ou fragmentária, mas, apesar disso, jamais questionamos o fato de serem Sonhos e não os confundimos com os produtos da vigília. 


                               



      Um segundo grupo é formado pelos Sonhos que, embora sejam coerentes em si e tenham um sentido claro, produzem, ainda assim, um efeito desconcertante, pois não vemos como encaixar esse sentido em nossa vida anímica. Tal é o caso ao sonharmos, por exemplo, que um parente de quem gostamos muito morreu de peste, sem que tenhamos qualquer razão para esperar, temer ou presumir uma coisa dessas; e nos perguntamos, assombrados: "Como é que fui arranjar essa ideia?"

      O terceiro grupo, enfim, contém os Sonhos destituídos de sentido ou inteligibilidade, que parecem desconexos, confusos e sem significado. A esmagadora maioria dos produtos de nosso sonhar exibe essas características, que constituem a base da opinião desfavorável que se tem dos Sonhos e fundamentam a teoria médica de que eles são o resultado de uma atividade anímica restrita. Raramente faltam os mais evidentes sinais de incoerência, sobretudo nas composições oníricas de extensão e complexidade consideráveis.

      O contraste entre os conteúdos manifesto e latente dos Sonhos só tem importância, é claro, para os Sonhos da segunda categoria e, mais particularmente, os da terceira. É ai que nos confrontamos com enigmas que só desaparecem depois de substituirmos o Sonho manifesto pelos pensamentos latentes que estão por trás dele; e foi com um espécime da última categoria - um Sonho confuso e ininteligível - que se efetuou a análise que acabo de relatar.    


     
      3° O Sonho Das Crianças (Realizações De Desejos) - Ocorre que os Sonhos das crianças são ...- plenos de sentido e não enigmáticos. Temos aí, alias, outro argumento contra a teoria que vai buscar a origem dos Sonhos numa atividade cerebral dissociada durante o sono, pois por que é tal redução do funcionamento psíquico seria característica do estado de sono dos adultos, mas não do das crianças? Por outro lado, é-nos plenamente lícito esperar que a explicação dos processos psíquicos das crianças, em que é bem possível que eles sejam muito simplificados, venha a se revelar um prelúdio indispensável à investigação da Psicologia dos Adultos.


    


       ... Na noite que precede uma viagem, não raro sonhamos já ter chegado a nosso destino; do mesmo modo, antes de uma ida ao teatro ou a uma festa, o Sonho muitas vezes antecipa o prazer futuro - por impaciência, por assim dizer. Noutros Sonhos, a realização de desejo se expressa num grau mais indireto; é preciso estabelecer alguma ligação ou implicação - isto é, o trabalho de interpretação tem de ser iniciado - para que se possa reconhecer a realização do desejo.


      Entretanto, antes de nos afastarmos dos Sonhos infantis, com sua indisfarçada realização de desejo, não devo deixar de mencionar uma das principais características dos Sonhos, que há muito se evidenciou e que ressalta precisamente nesse grupo com particular clareza. Cada um desses Sonhos pode ser substituído por uma frase desiderativa: "Ah, se o passeio no lago tivesse durado mais!" - "Oxalá eu já estivesse asseado e vestido!" - "Que bom se eu pudesse ter guardado as cerejas em vez de dá-las a meu tio!" Mas os Sonhos nos fornecem mais do que essas frases desiderativas. Mostram-nos o desejo já realizado; representam sua realização como real e presente; e o material empregado na representação onírica consiste principalmente, embora não exclusivamente, em situações e em imagens sensoriais, sobretudo de caráter visual. Portanto, mesmo nesse grupo infantil, não está completamente ausente uma espécie de transformação que merece ser descrita como trabalho do Sonho: um pensamento expresso no subjuntivo (modo de desejo) é substituído por uma representação no presente do indicativo.



domingo, 29 de maio de 2016

Sobre Os Sonhos

                                                                   Sobre Os Sonhos

                                                                   Uber den Traum


                                                                      Capítulo 2


       1º Como Explicar Os Sonhos? - Um dia descobri, para meu grande assombro, que a visão dos Sonhos que mais se aproximava da verdade não era a médica, mas a popular, por mais que ainda estivesse semi-envolta na superstição. É que fora levado a novas conclusões sobre o tema dos Sonhos ao aplicar-lhes um novo método de investigação psicológica que prestara excelentes serviços na solução das fobias, obsessões e delírios, etc. Desde então, sob o nome de "Psicanálise", ele encontrou aceitação por toda uma escola de pesquisadores. De fato, as numerosas analogias existentes entre a vida onírica e uma grande variedade de estados de enfermidade psíquica na vida de vigília foram corretamente observadas por muitos investigadores médicos. Portanto, parecia haver boas razões para esperar que um método de investigação que dera resultados satisfatórios no caso das estruturas psicopáticas fosse também útil para esclarecer os sonhos. As fobias e as obsessões são tão estranhas à consciência normal quanto os sonhos à consciência de vigília; sua origem é tão desconhecida da consciência quanto a dos Sonhos. No caso dessas estruturas psicopáticas, considerações de ordem prática levaram a uma investigação de sua origem e modo de desenvolvimento; ocorre que a experiência havia demonstrado que a descoberta das sequências de pensamentos que, ocultas da consciência, ligam as ideais patológicas aos demais conteúdos psíquicos equivale a uma solução dos sintomas, e tem como consequência o domínio de ideias que até então não podiam ser inibidas. Assim, a Psicoterapia foi o ponto de partida do procedimento de que me vali para a explicação dos Sonhos.  





       2º Como Explicar Os Sonhos? O Procedimento - Quando o utilizamos com outra pessoa, digamos, um paciente com uma fobia, pedimo-lhe que dirija sua atenção para a ideia em causa, mas não para refletir sobre ela como tantas já fez, e sim para observar o que quer que lhe venha à mente, sem exceção, e comunicá-lo ao médico. Se ele então afirmar que sua atenção é incapaz de apreender coisa alguma, descartamos isso assegurando energicamente que uma ausência completa de qualquer conteúdo de representações é inteiramente impossível. E, de fato, logo lhe ocorrem numerosas ideias que o conduzirão a outras, mas que são invariavelmente prefaciadas por um juízo do auto-observador no sentido de que são absurdas ou sem importância, de que são irrelevantes e lhe ocorreram por acaso, sem qualquer ligação com o assunto em exame. Percebemos de imediato que era essa atitude critica que impedia o sujeito de comunicar qualquer dessas ideias, e que antes disso, na verdade, era ela que as impedia de tornarem conscientes. Quando conseguimos induzi-lo a abandonar sua crítica das ideias que lhe ocorrem e a continuar acompanhando as sequências de pensamentos que emergem enquanto ele mantém sua atenção voltada para elas, vemo-nos de posse de uma quantidade de material psíquico que logo constatamos estar claramente ligado à ideia patológica que foi nosso ponto de partida; esse material não tarda a revelar ligações entre a ideia patológica e outras, e acaba por permitir-nos substituir a ideia patológica por uma ideia nova, que se enquadra de maneira inteligível na trama anímica.




       Assim, basta-nos dizer que obtemos o material que nos permite resolver qualquer ideia patológica ao voltarmos nossa atenção precisamente para as "Associações Involuntárias", que "interferem em nossa reflexão" e que são normalmente descartadas por nossa faculdade crítica como dejetos sem valor.

       Entretanto, resolvi anotar, sem qualquer premeditação ou crítica, as Associações que se ofereceram à minha auto-observação. Como constatei, é aconselhável, para esse fim, dividir o Sonho em seus elementos e descobrir separadamente as associações ligadas a cada um desses fragmentos.


      3° O Sonho E Suas Ligações - Continuando. Vi então que os acontecimentos do Sonho eram uma reprodução de um pequeno episódio de natureza exatamente semelhante, que ocorrera entre minha mulher e eu na época em que a cortejava secretamente. A carícia que ela fez por baixo da toalha da mesa foi sua resposta a uma premente carta de amor. No Sonho, contudo, minha mulher foi substituída por alguém que era, comparativamente, uma estranha - E. L.

      A Sra. E. L. é filha de um homem com quem estive certa vez endividado. Não pude deixar de notar que isso revelava uma ligação insuspeitada entre partes do conteúdo do Sonho e minhas associações. Quando se segue a cadeia de associações que parte de um elemento do conteúdo do Sonho, logo se é reconduzido a outro de seus elementos. Minhas associações ao Sonho estavam trazendo à luz ligações que não eram visíveis no próprio Sonho.

      Seguindo as associações nascidas dos elementos isolados do Sonho, separados do seu contexto, cheguei à diversos pensamentos e recordações que não pude deixar de reconhecer como produtos importantes de minha vida anímica. Esse material, revelado pela análise do Sonho, estava intimamente ligado com seu conteúdo; não obstante, a ligação era de tal ordem que eu nunca poderia ter inferido o material novo a partir do conteúdo onírico. O Sonho foi desprovido de afetos, desconexo e ininteligível, mas, enquanto ia produzindo os pensamentos que estavam por trás do Sonho, dei-me conta de impulsos afetivos intensos e bem fundados; os próprios pensamentos enquadraram-se imediatamente em cadeias lógicas e que certas representações centrais apareciam mais de uma vez. Assim, os contrastes entre "egoístas" e "altruístas" e entre os elementos "estar em débito" e "receber sem pagar" foram representações centrais desse tipo, que não figuraram no próprio Sonho. Eu poderia apertar mais os fios da trama do material revelado pela análise e mostrar então que eles convergem para um único ponto nodal, mas certas considerações de natureza pessoal, e não científica, impedem-me de fazê-lo em público. Eu seria obrigado a deixar transparecer muitas coisas que mais vale permanecerem em segredo, pois, no caminho da minha descoberta da solução do Sonho, revelou-se toa sorte de coisas que eu não estava disposto a admitir sequer para mim mesmo. Mas então, poderão perguntar, porque não escolhi algum outro Sonho cuja análise se prestasse melhor a ser comunicada, de modo que eu pudesse fornecer provas mais convincentes do sentido e da inter-relação do material descoberto pela análise? A resposta é que qualquer Sonho de que eu tentasse tratar levaria a coisas igualmente difíceis de comunicar e me imporia idêntica discrição.






      4° Sonho: O Substituto Dos Processos De Pensamento - ... sou levado a encarar o Sonho como uma espécie de substituto dos processos de pensamento repletos de significação e afeto aos quais cheguei após a conclusão da análise. Não reconhecemos ainda a natureza do processo que fez com que o Sonho fosse gerado a partir desses pensamentos, mas podemos perceber que é errôneo encará-lo como puramente físico e sem sentido psíquico, como um processo nascido da atividade isolada de grupos separados de células cerebrais despertadas do sono.


      5° Sonho Latente E Conteúdo Manifesto - Penso estar autorizado, portanto, a adotar uma terminologia que fixe nossa nova descoberta. Para contrastar o Sonho, tal como retido em minha memória, com o material pertinente descoberto por sua análise, chamarei ao primeiro "Conteúdo Manifesto Do Sonho", e ao segundo - sem fazer, a princípio, nenhuma outra distinção -, "Conteúdo Latente Do Sonho". Vejo-me então frente a dois novos problemas não formulados até agora: (1) Qual foi o processo psíquico que transformou o conteúdo latente do Sonho no conteúdo manifesto que me é conhecido através da memória? (2) Que motivo ou motivos tornaram necessária essa transformação? ...uma vez que atribuo todas as visões contraditórias e incorretas da vida onírica constantes da bibliografia sobre o assunto à ignorância do conteúdo latente dos Sonhos, tal como revelado pela análise, terei doravante o máximo cuidado para evitar a confusão entre o Sonho Manifesto  e os Pensamentos Oníricos Latentes.  

sexta-feira, 22 de janeiro de 2016

Sobre Os Sonhos

                                                   Sobre Os Sonhos
                                                   Uber Den Traum


                   (a) Edições Alemãs:
                     
                   1901 Uber den Traum. Publicada pela primeira vez como parte                              (págs.307-344) de uma publicação seriada, Grenzfragen des                                  Nervenund Seelenlebens, org. por L. Lowenfeld e H. Kurella,                                Wiesbaden, Bergmann.

                   1911 2ª edição. (Publicada como brochura separada e ampliada.)                            Mesmos organizadores, 44 págs.

                   1921 3ª edição. Munique e Wiesbaden, Bergmann, 44 págs.

                   1925 Nos Gesammelle Schriften de Freud, 3, 189-256, Leipzig,                            Viena e Zurique; Internationaler Psychoanalytischer Verlag.

                   1931 No volume coletivo de Freud, Sexualtheorie und Traumlehre,                        246-307, mesmos organizadores.

                   1942 Nas Gesammelle Werke de Freud, 2 e 3, 643-700, Londres,                           Imago Publishing Co.


                    (b) Traduções Inglesas:

                    1914 De M. D. Eder (com introdução de W. L. Mackenzie).                                   Londres, Heinemann; Nova Iorque, Rebman, XXXII + 110 págs.

                    1952 De James Strachey, Londres, Hogarth Press e Institute of                               Psycho-Analysis, VII + 80 págs. Nova Iorque, Norton, 120 págs.




      1º O Sonho E A Rejeição Mitológica - Durante a época que se pode descrever como pré-científica, os homens não tinham nenhuma dificuldade em descobrir uma explicação para os Sonhos. Quando se lembravam de um sonho depois de acordar, encaravam-no como uma manifestação favorável ou hostil de poderes superiores, demoníacos e divinos. Quando começaram a florescer as maneiras de pensar próprias da ciência natural, toda essa engenhosa mitologia se transformou em Psicologia, e hoje apenas uma pequena minoria de pessoas cultas duvida de que os Sonhos sejam um produto do próprio psiquismo do sonhador.




      2º O Sonho Carece Ser Esclarecido - Desde a rejeição da hipótese mitológica, porém, os Sonhos passaram a carecer de uma explicação. As condições de sua origem, sua relação com a vida anímica de vigília, sua dependência de estímulos que se impõem à percepção durante o estado de sono, as muitas peculiaridades de seu conteúdo que repugnam ao pensamento desperto, a incoerência entre suas imagens de representação e os afetos a elas ligados e, por fim, seu caráter transitório, a maneira como o pensamento de vigília os põe de lado como algo que lhe é estranho, e os mutila ou extingue na memória - todos esses problemas, e outros ainda, vem aguardando esclarecimento há muitas centenas de anos e, até agora, nenhuma solução satisfatória foi proposta para eles.

      Mas o que se coloca em primeiro plano em nosso interesse é a questão da Significação dos Sonhos, questão esta que encerra um duplo sentido. Em primeiro lugar, ela indaga sobre a Significação Psíquica do Sonhar, sobre a relação dos Sonhos com outros processos anímicos e sobre sua eventual função biológica; em segundo, busca descobrir se os Sonhos podem ser interpretados, se o conteúdo de cada Sonho tem um "sentido" tal como estamos acostumados a encontrar em outras estruturas psíquicas.




      3º As Linhas De Pensamentos Dos Sonhos - Na avaliação da significação dos Sonhos, três linhas de pensamento podem ser distinguidas.

      Uma delas, que ecoa, por assim dizer, a antiga supervalorização dos Sonhos, se expressa nos trabalhos de certos filósofos. Eles consideram que a base da vida onírica é um estado peculiar de atividade anímica e chegam até a aclamar esse estado como uma elevação a um nível superior. Por exemplo, Schubert [1814] declara que os Sonhos são a emancipação do espírito do jugo da natureza externa e a liberação da alma das amarras dos sentidos. Outros pensadores, sem irem tão longe assim, insistem, não obstante, em que os Sonhos brotam essencialmente de impulsos da alma e representam manifestações de forças anímicas impedidas de se expandirem livremente durante o dia. (Cf. a "Fantasia Onírica" de Scherner [1861, 97 e segs.] e Volkelt [1875, 28 e segs.].) Um grande número de observadores concorda em atribuir à vida onírica a capacidade de um funcionamento superior, pelo menos em certos âmbitos (na memória, por exemplo).



      4° A Visão Médica Sobre Os Sonhos - Em nítido contraste com isso, a maioria dos autores médicos adota uma visão segundo a qual os Sonhos mal chegam a atingir o nível de fenômenos psíquicos. Segundo sua teoria, os únicos instigadores dos Sonhos são os estímulos sensoriais e somáticos que incidem sobre a pessoa adormecida desde o exterior, ou que se tornam acidentalmente ativos em seus órgãos internos. O sonhado, argumentam eles, não pode reclamar para si mais sentido e significado do que, por exemplo, os sons que seriam produzidos se "os dez dedos de um homem que nada conhece de música vagassem pelas teclas de um piano". [Strumpell, 1877, 44.] Os Sonhos são descritos por Binz [´1878, 35] como não passando de "processos somáticos inúteis em todos os casos e, em muitos deles, positivamente patológicos". Todas as características da vida onírica, portanto. seriam explicadas como devidas à atividade desconexa de órgãos ou grupos de células isoladas num cérebro no mais adormecido, atividade essa que lhes é imposta por estímulos fisiológicos.




      5° Visão Popular Sobre Os Sonhos - A opinião popular é pouco afetada por esse juízo científico e não se interessa pelas origens dos sonhos; parece persistir na crença de que, apesar de tudo, os Sonhos possuem um sentido, que se relaciona com a predição do futuro e pode ser descoberto por algum processo de interpretação de um conteúdo frequentemente confuso e enigmático. Os métodos de interpretação empregados consistem em transformar o conteúdo do Sonho tal como ele é lembrado, seja substituindo-o aos pedacinhos, de acordo com uma chave fixa, seja substituindo a totalidade do sonho por um outro todo com o qual ela mantém uma relação simbólica. As pessoas sérias se riem desses esforços: "Traume sind Schaume" - "Os Sonhos São Espumas".



quinta-feira, 9 de julho de 2015

Por Que A Psicanálise?

                                             Resumo Do 4° Capítulo 

                                        O Homem Comportamental


   

      01º As Diferentes Revisões Do DSM (Manual Diagnóstico E Estatístico Dos Distúrbios Mentais) - Os conceitos (Psicose, Neurose, Perversão) foram substituídos pela noção frouxa de "Distúrbio" (disorder = distúrbio, desordem), e as entidades clínicas foram abandonadas em favor de uma caracterização sintomática desses famosos Distúrbios. Assim, a Histeria foi reduzida a um Distúrbio Dissociativo ou "Conversivo", passível de ser tratado como um Distúrbio Depressivo, e a Esquizofrenia foi assimilada a uma perturbação do curso do pensamento etc.







      Por outro lado, na tentativa de evitar qualquer polêmica, as diferentes versões do DSM acabaram por abolir a própria ideia de doença. A expressão "Distúrbio Mental" serviu para contornar o problema delicado da inferiorização do paciente, que, se fosse tratado como doente, imporia o risco de exigir "indenizações" do praticante do DSM e até de mover processos judiciais contra ele. Dentro dessa mesma perspectiva, o adjetivo "alcoólatra" foi substituído por "dependente de álcool", além de se haver preferido renunciar à ideia de "Esquizofrenia" em benefício de uma parífrase: "afetado por distúrbios que remetem a uma perturbação de tipo esquizofrênico".

      Igualmente preocupados em preservar as diferenças culturais, os autores do DSM debateram a questão de saber se as condutas políticas, religiosas ou sexuais chamadas "desviantes" deveriam ou não ser assimiladas a Distúrbios Do Comportamento. Concluíram pela negativa, mas afirmaram também que o critério de "agnóstico" só teria valor se o paciente pertencesse a um grupo étnico diferente do examinador.

      À medida que foram sucedendo as diferentes revisões, os promotores do DSM foram caindo um pouco mais no ridículo. Entre 1973 e 1975, chegaram até a se esquecer dos princípios fundamentais da ciência. Substituíram "Homossexualidade" por "Homossexualidade Egodistônica", expressão designativa daqueles que são mergulhados na depressão por suas Pulsões. Tratou-se, na verdade, como assinalou Lawrence Hartmann, de eliminar uma entidade nosográfica para substituí-la pela descrição de um estado depressivo ou ansioso passível de ser tratado pela Psicofarmacologia ou pelo comportamentalismo: "Acho preferível", disse ele, "não utilizar a palavra "homossexual", que pode prejudicar a pessoa. A palavra Depressão não cria problemas, nem tampouco Neurose De Angústia (...). Utilizo as categorias mais vagas e mais genéricas, desde que sejam compatíveis com minha preocupação com a verdade. As companhias de seguros estão convenientemente informadas de que os rótulos diagnósticos que lhes são comunicados são suavizados para não prejudicar o paciente.






      Em 1975, uma comissão de psiquiatras negros exigiu a inclusão do Racismo entre os Distúrbios Mentais. Principal redator do Manual, Robert Spitzer rejeitou essa sugestão justificadamente, mas deu ao Racismo uma definição absurda: "No âmbito do DSM III, deveríamos citar o Racismo como bom exemplo de um estado correspondente a um funcionamento psicológico não ótimo, que, em certas circunstâncias, fragiliza a pessoa e conduz ao aparecimento de sintomas."







      Os princípios enunciados no Manual foram tomados como fonte autorizada de um extremo a outro do planeta a partir do momento em que foram adotados pela Associação Mundial De Psiquiatria (WPA), fundada por Henri Ey em 1950, e, mais tarde, pela Organização Mundial De Saúde (OMS). Com efeito, na décima revisão de sua classificação das doenças (CIM-10), no capítulo F, a OMS definiu os Distúrbios Mentais e os Distúrbios Do Comportamento segundo os mesmos critérios do DSM IV. Por último, depois de 1994, na nova revisão do DSM (ou DSM IV-R), os mesmos princípios - denominados Zero-to-three (ou 0-3) - foram acrescentados ao estudo dos comportamentos considerados dissociativos, traumáticos e depressivos do bebê e das crianças pequenas.



Henri Ey




      O desmembramento dos quatro grandes modelos, que haviam permitido à psiquiatria dinâmica associar uma teoria do sujeito a uma nosologia e a uma antropologia, teve o efeito, portanto, de separar a Psicanálise da psiquiatria, de remeter essa última ao campo de uma medicina biofisiológica que exclui a Subjetividade e, mais tarde, de favorecer uma extraordinária exploração das reivindicações de Identidade e das escolas de Psicoterapia, primeiro nos Estados Unidos e, depois, em todos os países da Europa.

      Nascidas ao mesmo tempo que a Psicanálise, essas escolas de Psicoterapia tem como ponto comum contornar três conceitos Freudianos, a saber, os de Inconsciente, Sexualidade e Transferência. Elas opõem ao Inconsciente Freudiano um Subconsciente Cerebral, biológico ou automático; à Sexualidade, no sentido Freudiano (conflito psíquico), ora preferem uma teoria dos instintos. Por último, opõem à transferência como motor do tratamento clínico uma relação terapêutica derivada da sugestão. 

      Entretanto, deve-se que constatar que somente a Psicanálise foi capaz, desde suas origens, de realizar a síntese dos quatro grandes modelos da psiquiatria dinâmica que são necessários a uma apreensão racional da Loucura e da doença Psíquica. Com efeito, ela tomou emprestado da psiquiatria o modelo nosográfico, da psicoterapia o modelo de tratamento psíquico, da filosofia uma teoria do sujeito, e da antropologia uma concepção de cultura fundamentada na ideia de uma universalidade do gênero humano que respeita as diferenças. 

      A menos que venha a se desonrar, portanto, ela não pode, como tal, contribuir para a ideia, hoje dominante, de uma redução da organização psíquica a comportamentos. Se o termo "Sujeito" tem algum sentido, a subjetividade não é mensurável nem quantificável: ela é a prova, ao mesmo tempo visível e invisível, consciente e Inconsciente, pela qual se afirma a essência da experiencia humana. 

sexta-feira, 24 de abril de 2015

Por Que A Psicanálise?

                                            Resumo Do 4° Capítulo 

                                        O Homem Comportamental


      1° A Humanização Do Sofrimento Através Do Modelo Culturalista - Desvinculado dos outros grandes modelos da Psiquiatria Dinâmica, o Modelo Culturalista, na verdade, parece pôr em prática uma humanização do sofrimento, embora, na realidade, leve o paciente a acreditar que seu mal estar não provém dele ou de suas relações com os outros, mas de espíritos maléficos, dos astros, das pessoas que lhe deitam mau olhado ou, numa palavra, da "cultura" e da chamada pertença étnica. A explicação através do cultural, portanto, associa-se à casualidade orgânica e remete o sujeito ao universo da possessão.


      2° Como O DSM Foi Elaborado? - (...) estudar a evolução do famoso Manual Diagnóstico E Estatístico Dos Distúrbios Mentais (DSM), cuja primeira versão (DSM I) foi elaborada pela American Psychiatric Association (APA) em 1952.

      Nessa ocasião, o Manual levava em conta as conquistas da Psicanálise e da Psiquiatria Dinâmica. Defendia a ideia de que os distúrbios psíquicos e mentais decorriam essencialmente da história inconsciente do sujeito, de seu lugar na família e de sua relação com o meio social. (...) Por essa perspectiva, a noção de causalidade orgânica não era desprezada, e a Psicofarmacologia, então em plena extensão, era utilizada em associação com o tratamento pela fala ou com outras terapias dinâmicas.




      Depois de 1952, o Manual foi revisado pela APA em diversas ocasiões, sempre no sentido de um abandono radical da síntese efetuada pela Psiquiatria Dinâmica. Calcado no esquema sinal-diagnóstico-tratamento, ele acabou eliminando de suas classificações a própria subjetividade. Houve quatro revisões: em 1968 (DSM II), em 1980 (DSM III), em 1987 (DSM III-R) e em 1994 (DSM IV). O resultado dessa operação progressiva de limpeza, dita "ateórica", foi um desastre. Fundamentalmente, ela visou a demonstrar que o distúrbio da alma e do psiquismo devia ser reduzido ao equivalente à pane de um motor.




     3° Existe CURA Em Psicanálise? - Trata-se de uma nuance considerável, e que diz respeito à própria definição do status da cura em Psicanálise. Com efeito, como já recordei, no campo do psiquismo não existe cura no sentido como esta é constatada no campo das doenças somáticas, sejam elas genéticas ou orgânicas. Na medicina científica, a eficácia apoia-se no modelo sinais-diagnóstico-tratamento. Constatam-se os sintomas (febre), dá-se um nome à doença (febre tifóide) e se administra um tratamento (medicamento antibiótico). O doente então fica "curado" do mecanismo biológico da doença.



quinta-feira, 23 de abril de 2015

A Psicanálise Sob O Olhar De... Françoise Giroud

                                                        A Análise


      "A Análise é árdua e faz sofrer. Mas, quando se está desmoronando sob o peso das palavras recalcadas, das condutas obrigatórias, das aparências a serem salvas, quando a imagem que se tem de si mesmo torna-se insuportável, o remédio é esse. Pelo menos, eu o experimentei e guardo por Jacques Lacan uma gratidão infinita (...). Não mais sentir vergonha de si mesmo é a realização da liberdade (...). Isso é o que uma Psicanálise bem conduzida ensina aos que lhe pedem socorro."



Françoise Giroud