quinta-feira, 2 de outubro de 2014

Por Que A Psicanálise?

                                                           Resumo Do Capítulo 1

                                                           A Derrota Do Sujeito



      01 O Manifestar-Se Do Sofrimento Psíquico - O Sofrimento Psíquico manifesta-se atualmente sob a forma da Depressão. Atingido no corpo e na alma por essa estranha síndrome em que se misturam a Tristeza e a Apatia, a busca da Identidade e o Culto De Si Mesmo, o homem deprimido não acredita mais na validade de nenhuma Terapia. No entanto, antes de rejeitar todos os tratamentos, ele busca desesperadamente vencer o Vazio de seu desejo. Por isso, passa da Psicanálise para a Psicofarmacologia e da Psicoterapia para a Homeopatia, sem se dar tempo de refletir sobre a origem de sua infelicidade. Aliás, ele já não tem tempo para nada, à medida que se alongam o tempo de Vida e o do Lazer, o tempo do desemprego e o tempo do tédio .






      02 O Mundo Do "Contrário" - Quanto mais a Sociedade apregoa a emancipação, sublinhando a Igualdade de todos perante a lei, mais ela acentua as diferenças. No cerne desse dispositivo, cada um reivindica sua singularidade, recusando-se a se identificar com as imagens da Universalidade, julgadas caducas. Assim, a era da Individualidade substitui a da subjetividade; dando a si mesmo a Ilusão de uma liberdade irrestrita, de uma independência sem desejo e de uma historicidade sem história, o homem de hoje transformou-se no contrário de um sujeito. 

      Longe de construir seu Ser a partir da Consciência das determinações Inconscientes que o perpassam à sua revelia, longe de ser uma Individualidade Biológica, longe de pretender-se um sujeito Livre, desvinculado de suas raízes e de sua Coletividade, ele se toma por senhor de um destino cuja significação reduz a uma reivindicação normativa. Por isso, liga-se a redes, a grupos, a coletivos e a comunidades, sem conseguir afirmar sua verdadeira Diferença.






      03 A Era Das Medicinas Paralelas - Cada paciente é tratado como um ser Anônimo, pertencente a uma totalidade orgânica. Imerso numa Massa em que todos são criados à imagem de um Clone, ele vê ser-lhe receitada a mesma gama de medicamentos, seja qual for o seu Sintoma. Ao mesmo tempo, no entanto, busca outra saída para seu infortúnio, De um lado, entrega-se à Medicina Científica, e de outro, aspira a uma Terapia que julga mais apropriada para o reconhecimento de sua identidade. Assim, perde-se no Labirinto Das Medicinas Paralelas.

      É por isso que assistimos, nas sociedades ocidentais, a um crescimento inacreditável do Mundinho Dos Curandeiros, dos Feiticeiros, dos Videntes e dos Magnetizadores. Frente ao cientificismo erigido em Religião e diante das Ciências Cognitivas, que valorizavam o homem-máquina em detrimento do homem desejante, vemos florescer, em contrapartida, toda sorte de práticas, ora surgidas da pré-história do Freudismo, ora de uma concepção ocultista do corpo e da mente: magnetismo, sofrologia, naturopatia, iridologia, auriculoterapia, energética transpessoal, sugestologia, mediunidade, etc. Ao contrário do que se poderia supor, essas práticas seduzem mais a classe média - funcionários, profissionais liberais e executivos - do que os meios populares, ainda apegados, apesar da precariedade da 'Vida Social', a uma concepção republicana da medicina científica.

      (A Ilusão Da Cura) - Essas práticas tem como denominador comum o oferecimento de uma crença - e portanto, de uma Ilusão De Cura - a pessoas mais abastardas, mais desestabilizadas pela crise econômica, e que ora se sentem vítimas de uma tecnologia médica demasiadamente distanciada de seu sofrimento, ora vítimas da impotência real da medicina para curar certos Distúrbios Funcionais. Assim, é que L'Express publicou uma pesquisa que revela que 25% dos franceses passaram a buscar na reencarnação e na crença em vidas anteriores uma solução para seus problemas existenciais (pesquisa publicada em 1997).






      04 A Era Da Evitação Na Sociedade Moderna - A sociedade democrática moderna quer banir de seu horizonte a realidade do Infortúnio, da Morte e da Violência, ao mesmo tempo procurando integrar num sistema único as diferenças e as resistências. Em nome da globalização e do sucesso econômico, ela tem tentado abolir a ideia de Conflito Social. Do mesmo modo, tende a criminalizar as revoluções e a retirar o heroísmo da guerra, a fim de substituir a política pela ética e o julgamento histórico pela sanção judicial. Assim, ela passou da Era Do Confronto para a Era Da Evitação, e do culto da glória para a revalorização dos covardes. Hoje em dia, não é chocante... transformar os heróis em traidores... Nunca se celebrou tanto o dever da memória, nunca houve tanta preocupação com a Shoah (termo hebraico que designa o genocídio perpetrado pelos nazistas contra os judeus na Segunda Guerra Mundial) e o extermínio dos judeus e, no entanto, nunca a revisão da história foi tão longe.






      05 O Silencioso Ódio Ao Outro - Daí uma concepção da norma e da patologia que repousa num princípio intangível: todo indivíduo tem o direito e, portanto, o dever de não mais manifestar ser Sofrimento, de não mais se entusiasmar com o menor ideal que não seja o do pacifismo ou da moral humanitária. Em consequência disso, o ódio ao outro tornou-se sub-reptício, perverso e ainda mais temível, por assumir a máscara de dedicação à vítima. Se o ódio pelo outro é, inicialmente, o ódio a si mesmo, ele repousa, como todo Masoquismo, na negação imaginária da alteridade. O outro passa então a ser sempre uma vítima, e é por isso que se gera a intolerância, pela vontade de instaurar no outro a coerência soberana de um Eu Narcísico, cujo ideal seria destruí-lo antes mesmo que ele pudesse existir.






      06 Depressão X Histeria - A substituição é acompanhada, com efeito, por uma valorização dos processos psicológicos de normalização, em detrimento das diferentes formas de exploração do Inconsciente. Tratado como uma Depressão, o Conflito Neurótico Contemporâneo parece já não decorrer de nenhuma casualidade psíquica oriunda do Inconsciente. No entanto, o Inconsciente ressurge através do corpo, opondo uma forte Resistência às disciplinas e às práticas que visam a repeli-lo. Daí o relativo fracasso das Terapias que proliferam. Por mais que estas se debrucem com compaixão sobre a cabeceira do sujeito depressivo, não conseguem curá-lo nem apreender as verdadeiras causas de seu tormento. Só fazem melhorar seu estado,deixando-o esperar por dias melhores... 

      A Histeria sempre pôs em primeiro plano o aparelho locomotor. Ficamos impressionados ao ver como se pode esquecê-la. E também o quanto o fato de evocá-las desperta, no pessoal médico e não médico, inquietação, recusa ou mesmo agressividade em relação ao paciente, assim como por parte daquele ou daquela que recebe esse diagnóstico.





      07 Pequena Nota Sobre Depressão - Saída da neurastenia, noção abandonada por Freud, e da Psicastenia descrita por Janet, a Depressão não é uma Neurose nem uma Psicose nem uma Melancolia, mas uma entidade nova, que remete a um "Estado" pensado em termos de "Fadiga", "Déficit" ou "Enfraquecimento Da Personalidade". O crescente sucesso dessa designação deixa bem claro que as sociedades democráticas do fim do século XX deixaram de privilegiar o conflito como núcleo normativo da formação subjetiva. Em outras palavras, a concepção freudiana de um sujeito do Inconsciente, Consciente de sua liberdade, mas atormentado pelo Sexo, pela Morte e pela Proibição, foi substituída pela concepção mais psicológica de um indivíduo depressivo, que foge de seu Inconsciente e está preocupado em retirar de si a essência de todo o conflito.






      08 O Que Busca O Depressivo? - ... o deprimido deste fim de século (XX) é herdeiro de uma dependência viciada no mundo. Condenado ao esgotamento pela falta de perspectiva revolucionária, ela busca na droga ou na religiosidade, no higienismo ou no culto de um corpo perfeito o ideal de uma felicidade impossível... É assim que, atualmente, os consumidores de tabaco, álcool e psicotrópicos são assemelhados a toxicômanos, considerados perigosos para eles mesmos e para a coletividade. Ora, dentre esses novos "doentes", os tabagistas e os alcoólatras são tratados como deprimidos a quem se receitam psicotrópicos. Mas, que medicamentos do espírito será preciso inventar, no futuro, para tratar da dependência dos que houverem "curado" de seu alcoolismo, seu tabagismo ou algum outro vício (o sexo, a comida, o esporte, etc.), substituindo um abuso por outro? 


  

Por Que A Psicanálise?


Título: Por Que A Psicanálise?
Idioma: Português
Páginas: 164
Ano Da Obra: 1999
Ano De Edição: 2000
Edição:
Editor: Jorge Zahar (Rio De Janeiro)
Autora: Elisabeth Roudinesco
Tradução: Vera Ribeiro (Psicanalista)